Um jovem negro escravo mudou a história da produção de baunilha – o tempero mais consumido no mundo

Quem gosta de Coca-Cola, ou de sorvete, ou até do perfume Chanel N°5, talvez não saiba que a baunilha (ingrediente presente em todos eles) é o tempero mais popular do mundo. E talvez fique surpreso ao descobrir que ela só alcançou este patamar graças à perspicácia de um jovem negro escravo.

* A primeira receita de sorvete de baunilha nos EUA foi escrita por Thomas Jefferson, depois dele conhecer a iguaria, por volta de 1785, quando era embaixador na França. Antes de se tornar presidente americano, ele ficou encantado com o sabor. Mas o gosto não era exatamente novidade para europeus, que já conheciam desde a colonização da América.

* O fruto de uma orquídea trepadeira já era bem popular na civilização asteca. Ao secar, virava um tempero chamado “flor preta”. A partir de 1519, os espanhóis começaram a levar para a Europa a “vagenzinha”, a vainilla , que atraiu a realeza (a rainha Elizabeth I , da Inglaterra, misturava ao pudim real).

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* À época, o México só produzia 2 toneladas por ano, a oferta era pouca para muita demanda. Espanhóis tentaram plantar nas Filipinas; holandeses, em Java; ingleses, na Índia. A solução veio de uma ilha no Oceano Índico, a 800 quilômetros de Madagascar, conhecida como Bourbon, pelos ingleses ou Île Bonaparte, pelos franceses – a depender do colonizador. Hoje se chama Reunião.

* Na ilha, o fazendeiro Ferréol Bellier-Beaumont ficou surpreso ao perceber que sua orquídea, estéril por 20 anos, tinha dado um fruto. Mais espantado ainda, quando o escravo Edmond reivindicou a proeza. Ele tinha 12 anos de idade e ninguém acreditou na história q contava. Era por volta de 1841.

* Edmond explicou que tinha usado um pedaço de bambu do tamanho de um palito de dentes para puxar a borda da flor e juntar a antera com o estigma. O resultado foi o fruto. A partir daí, o garoto passou a viajar pela ilha ensinando a polinização a outros escravos. Hoje, os franceses chamam a técnica de “le geste d’Edmond”.

* Até 1850, a safra total em Reunião era de 45 quilos de vagem de baunilha por ano. Até 1860, saltou para 2 toneladas por ano. Antes da virada para o século XX já era de 200 toneladas . Pela descoberta, Edmond ganhou alforria em julho de 1848, com sobrenome Albius (do latim “mais branco”). Para muitos, foi considerado um batismo racista.

* Há uma estátua em bronze na cidade Sainte-Suzanne, na ilha de Reunião, com o menino de gravata-borboleta e descalço. Edmond morreu aos 51 anos, em 1880, “miserável e sofrido”, segundo nota do jornal Le Moniteur. Já a produção de baunilha revolucionou a economia mundial e, em 2010, chegou a 5 milhões de vagens. É um artigo bem valorizado, pode custar mais do que prata e alguns produtores vendem um quilo da fava seca por até 500 dólares.

Estátua de Edmond Albius, em Sainte-Suzanne, na ilha de Reunião

* Quase todas as informações dessa postagem foram obtidas no livro A História Secreta da Criatividade, de Kevin Ashton.

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