PT da Bahia se transforma no mais eficiente do país e sonha com primeiro baiano eleito presidente

Quando as urnas de 7 de outubro transformaram o PT baiano no principal diretório da sigla no Brasil, a comemoração só durou até a madrugada. Já na segunda-feira, as principais lideranças do partido estavam empenhadas no futuro.

Não exatamente no segundo turno e na possibilidade, reduzida, de eleger o advogado e ex-ministro da Educação Fernando Haddad, de 55 anos. Os chamados caciques baianos do PT já queriam aproveitar o excelente capital político como uma maneira de pavimentar o caminho até a rampa do Palácio do Planalto.

Levantamento feito por este blog (veja tabela abaixo) mostra como a composição dos parlamentares federais da Bahia foi decisiva para elevar o PT a uma nova liderança entre as bancadas na Câmara Federal. Dos 39 deputados baianos, 8 são do PT, número igual ao conquistado em Minas Gerais e São Paulo, que têm 14 e 31 vagas a mais, respectivamente. Mais do que isso, o desempenho dos baianos deu ao partido a possibilidade de sonhar com a presidência da casa ou a liderança da oposição – a depender do vitorioso no próximo dia 28.

Entre votos nominais e de legenda, o PT conseguiu, em território baiano, 1.332.645 eleitores para deputado federal, seguido por PSD, com 796.769. O Democratas obteve 580.390 do total de 7.050.168 de votos na Bahia. Para deputado estadual, o PT garantiu 1.124.678, seguido por 884.445 do PSD e 697.461 do DEM.

São números expressivos que animaram a militância. Enquanto os correligionários pensam nos resultados imediatos, Jaques Wagner, o senador baiano eleito com mais votos na história (4.253.331, ou 35,7%), faz cálculos pelo menos 12 anos à frente. Por baixo dos imperiais cabelos brancos do “Galego”, passam as perspectivas das próximas eleições municipais e estaduais, articulações e, sobretudo, a volta do PT a uma oposição que seja mais diplomática e menos corrosiva do que a dos anos 1990.

Internamente, os líderes do PT entendem que a vitória do ex-ministro da educação é remota, e que, fora da Bahia, os eleitores rejeitam o partido. Mas querem vender caro uma possível derrota. O primeiro caminho é usar artilharia pesada na campanha para depois colher os louros do que imaginam ser uma tragédia do eventual governo Bolsonaro. Aí, sim, esperam reconquistar, nacionalmente, a confiança da maioria do eleitorado.

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Outra questão é estudar com profundidade antropológica o que fez do estado a ilha de excelência, uma blindagem ideológica sobre os principais nomes do partido. Analistas enxergam que há muito mais do que o binônimo Lula + Bolsa Família para explicar o sucesso desta equação. Além da aprovação ao governo de Rui Costa, ficou constatado que o modelo de comunicação petista lembra a forma direta e rápida das mensagens na era carlista. Em outras palavras, o recado é entendido imediatamente: falou, o povo captou.

ACM Neto comemorando primeira eleição para prefeito, em 2002, com 33 anos

No auge do seu domínio político e eleitoral, Antonio Carlos Magalhães tinha sonhos lúcidos com um filho no Palácio do Planalto, mas eles foram interrompidos por um infarto, quase ao meio dia, de uma terça-feira, 21 de abril de 1998. Luís Eduardo Magalhães já tinha sido presidente da Câmara dos Deputados e era, mesmo contra a vontade pessoal, o virtual candidato ao governo da Bahia naquela eleição. Os planos eram de morar no Palácio do Alvorada logo depois de Fernando Henrique Cardoso, prolongando uma hegemonia de centro-direita que terminou interrompida na primeira eleição de Lula.

Catorze anos se passaram até o neto de ACM derrotar, em segundo turno, o petista Nelson Pelegrino na disputa pela prefeitura da capital. A partir da boca – e do apetite – de aliados, surgia uma receita doméstica que se convencionou chamar de Projeto Presidente. Naquele momento, a gestão municipal era encarada como a vitrine para demonstrar capacidade executiva e magnetismo eleitoral, além de sensibilizar apoiadores dos mais variados segmentos. Quando se fala em sensibilizar, quer dizer viabilizar recursos econômicos.

Sabe-se, agora, que uma das falhas foi terem sido ruidosos demais. A reeleição, tranquila em 2016, parecia confirmar o sucesso da reunião de tantos ingredientes. Só que aí veio 2018…

Tinha 2018 no meio do caminho.

Ah, esse ano que será ainda tão usado por estudantes de comunicação que estejam sem criatividade para trabalhos de conclusão de curso, ou por professores de ciência política que queiram ocupar seus alunos por um semestre inteiro, ou por políticos derrotados que precisem compensar os vencimentos perdidos encomendando a um ghost writer uma auto biografia bem remunerada pela editora.

O então senador ACM cumprimenta o presidente Lula, após audiência no Planalto

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Há que se fazer uma elipse para mostrar como um estado inteiro pode migrar de carlista para lulista em questão de uma eleição. Em 2002, o então ex-senador ACM declarou apoio a Lula contra o desafeto José Serra. “Lula é nordestino e Serra detesta o Nordeste. Então, vocês podem concluir”, avisou, bem antes da definição sobre os candidatos.

ACM só conseguiu adiar o próprio ocaso em quatro anos.

No âmbito doméstico, Paulo Souto derrotou Jaques Wagner no primeiro turno de 2002, mas recebeu o troco em 2006. Estava ali definido o sepultamento político do carlismo, com seu grande líder em vida. No epitáfio, até os menos privilegiados intelectualmente conseguiriam ler o nome Luiz Inácio Lula da Silva.

Na campanha de 2018, chegava a ser primária a análise de quem fosse comparar os programas políticos obrigatórios em São Paulo e na Bahia. No sudeste, quem tinha pretensões a subir nas pesquisas procurava atacar o Partido dos Trabalhadores (“ele foi ministro de Dilma”, “liderou a bancada de Lula”).

Na Bahia, colocar o adversário contra o PT era estratégia para minar o rival (“votou pelo impeachment”, “não é do time do PT”). As urnas mostraram que ambas as táticas deram certo. Cada qual no seu quadrado.

O resultado é que os números colocam o diretório da Bahia como o mais bem sucedido da sigla no país. Em termos proporcionais, elegeu mais de 20% da composição total, só perdendo para o Rio Grande do Norte (que teve 25%). A Bahia é seguida por Piauí (20%), Rio Grande do Sul (16,1%) e Minas Gerais (15%). No Ceará, o PT fez apenas três das 22 cadeiras do estado na Câmara. o PDT, de Ciro e Cid Gomes, liderou com seis deputados.

Wagner aproveita seu lance no tabuleiro; A primeira sinalização foi a de que busca um nome que esteja com idade entre 45 e 50 anos para suceder Rui Costa no Palácio de Ondina, em 2022.

O partido simbolizado por uma bandeira vermelha com uma estrela branca ao centro foi fundado em 1980 e chegou pela primeira vez o poder executivo nacional em 2003, com a posse de Lula. Em 2016, era tido como os dalit da Índia, a casta que tem os intocáveis, os párias, a quem se designam os trabalhos mais desagradáveis e abjetos.

Naquele momento, podem ter se inspirado na noção de egocentrismo do filósofo prussiano Friedrich Nietzsche, que chama de “obra-prima da arte da autopreservação”.

Ele diz em Ecce Homo:
“se o destino da missão está bem acima de uma dimensão mediana, nenhum perigo seria maior do que ver a si mesmo nela. Tornar-se o que se é pressupõe que não se tenha a mais longínqua noção do que se é. Desse ponto de vista, até mesmo os equívocos da vida têm seu próprio significado e valor, os caminhos vicinais e desvios temporários, os retardamentos, as ´modéstias´, a seriedade, todos desperdiçados com missões que estão além da missão”.

Se a constatação de Nietzsche sobrevive há mais de 120 anos, como não daria certo?

Em julho de 2018, a estatística do TSE mostra o PT como segundo maior em número de filiados (1.589.275), contra 2.394.436 do MDB, à frente dos 1.460.814 do PSDB.

Na Bahia, o partido é o terceiro, com 8,4% do total de filiados, equivalente a 84.061 militantes, atrás dos 94.315 do MDB e dos 89.572 do DEM. No estado de São Paulo, o PT tem 382.792 militantes cadastrados, perdendo apenas para os 522.243 do MDB.

Criado em São Paulo, o PT se tornou um ponto convergente entre pensadores, intelectuais e artistas, com militantes do movimento sindical das cidades do ABC.

As primeiras fichas de filiação foram assinadas pelo guerrilheiro e líder ideológico Apolônio de Carvalho, pelo crítico de arte Mário Pedrosa, pelo imortal Antônio Cândido e pelo historiador Sérgio Buarque de Hollanda, pai de Chico Buarque.

Faz-se tantas análises e rodeios para demonstrar duas coisas: ciclos políticos e eleitorais na Bahia costumam durar 16 anos até serem atualizados; há marcas de chocolates amargos cuja percentagem de carboidratos não supera 25% de uma barra. Isso mostra que conciliar sabor e saúde pode ser justamente uma questão de educar o paladar.

 

RANKING DE DESEMPENHO DO PT NA CÂMARA FEDERAL POR ESTADO

Rio Grande do Norte – 2 petistas – 8 vagas (25%)
Bahia – 8 petistas – 39 vagas (20,5%)
Piauí – 2 petistas – 10 vagas (20%)
Rio Grande do Sul – 5 petistas – 31 vagas (16,1%)
Minas Gerais – 8 petistas – 53 vagas (15%)
Ceará – 3 petistas – 22 vagas (13,6%)
Sergipe – 1 petista – 8 vagas (12,5%)
Tocantins – 1 petista – 8 vagas (12,5%)
Amazonas – 1 petista – 8 vagas (12,5%)
Distrito Federal – 1 petista – 8 vagas (12,5%)
Mato Grosso – 1 petista – 8 vagas (12,5%)
Mato Grosso do Sul – 1 petista – 8 vagas (12,5%)
Pará – 2 petistas – 17 vagas (11,7%)
São Paulo – 8 petistas – 70 vagas (11,4%)
Alagoas – 1 petista – 9 vagas (11,1%)
Paraná – 3 petistas – 30 vagas (10%)
Espírito Santo – 1 petista – 10 vagas (10%)
Paraíba – 1 petista – 12 vagas (8,3%)
Pernambuco – 2 petistas – 25 vagas (8%)
Santa Catarina – 1 petista – 16 vagas (6,25%)
Goiás – 1 petista – 17 vagas (5,88%)
Maranhão – 1 petista – 18 vagas (5,55%)
Rio de Janeiro – 1 petista – 46 vagas (2,17%)

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